O começo
Anselmo namorava a vizinha do lado. Religiosa, bondosa, amorosa,
Lourdinha não era muito bonita. Era prendada, mas um pouco feiosa. Pior: tinha mau
hálito.
A vizinha de frente era uma menina gostosa, cheirosa, libidinosa,
formosa, maravilhosa, deliciosa.
Dolores era mesmo gloriosa. Nunca deu muita bola pra Anselmo,
era amiga de infância da Lourdinha. No dia do noivado da amiga, quando Anselmo a
viu assim tão de perto, vestida de periguete, o noivo não tirava o olho dela e
se perguntava: “Por quê? Por que os homens
preferem as fogosas?”
Dolores já tinha se envolvido com quatro rapazes da rua que
comentavam entre si o quanto ela era voluptuosa.
Anselmo ouvia calado morrendo de inveja.
Tudo mudou quando ele comprou um carro em 80 prestações.
O meio
Dolores se impressionou. Foi o primeiro carro dos rapazes daquela
singela rua suburbana. Era um Ford Ka motor 1.000, o de menor preço no mercado.
Mas, era novo, zero km.
Dolores lhe pediu para dar uma volta: “Vamos, Lourdinha não vai saber de nada”.
Anselmo tomou coragem, faltou ao trabalho noturno como lanterninha de cinema e foram para a Barra. Dolores com aquela mini-saia e sem
sutiã. Blusa quase transparente. Uma loucura.
Na praia escura, conversa vai, conversa vem, aquele amasso,
Anselmo se empolgou e tentou ir adiante. Não conseguiu. “Sou virgem” – disse Dolores causando a maior surpresa.
A partir daí, o noivado já era. Passaram a namorar. Lourdinha
nunca mais falou com Dolores.
Passado algum tempo, Anselmo, louco de desejo e excitação,
resolveu casar.
Um ano após, tudo ia muito bem até que Lourdinha chamou Anselmo e entregou: “A Dolores está te traindo com os
ex-namorados, já transou com três dentro da tua casa”. Lourdinha jurou por
tudo que era mais sagrado.
O fim
Anselmo acreditou e foi se lamentar com seu melhor amigo.
“Todo homem já foi, é ou será corno um
dia” – dizia Jorginho
para consolar Anselmo – “tira da cabeça
essa tua idéia criminosa, pô!”.
Mesmo assim, Jorginho emprestou seu 32 enferrujado para Anselmo.
Voltou pra casa mais cedo e flagrou Dolores de baby-doll no portão com um ex-namorado que fugiu correndo. Discutiram asperamente.
No portão, Lourdinha a tudo assistia com um sorriso obsceno e
vingativo.
Anselmo quis matar Dolores. Não conseguiu, e, em lágrimas, a questionava: “Por quê? Por quê?”
Com aquela singeleza das periguetes, Dolores tentou explicar: “Eu apenas quis compensar os rapazes que
namorei e com quem nunca passei dos limites. Eu sempre disse que só depois que casasse. Sou mulher de palavra, Ainda falta um”.
Alucinado, Anselmo ofendeu-a o quanto pôde: “Você não presta, nunca prestou, merece morrer”.
Dolores, então, convenceu-o com um argumento irretorquível: “Mereço sim, mas você não merece ir pra
cadeia”.
Anselmo largou a arma no chão e saiu. Foi encher a cara no
botequim da esquina. Quando voltou, viu o alvoroço na casa da vizinha. Entrou.
Na sala, Lourdinha e Dolores jaziam estendidas no chão.
Dolores havia tomado chumbinho na frente da ex-amiga. E, logo
depois, descarregou o 32 enferrujado em Lourdinha que, morta, ainda mantinha aquele
sorriso obsceno e vingativo.
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