Há exatos dois anos, no dia 8 de julho de 2013, o Brasil foi
tomado por uma onda de ira corporativista contra um projeto que visava ampliar
a oferta de médicos especializados em saúde da família no País.
Naquele dia, o governo baixou a Medida Provisória criando o
Programa Mais Médicos que previa a importação de médicos de diversos países,
inclusive cubanos.
O Conselho Federal de Medicina e a oposição ao governo tentaram,
de todas as formas, impedir que os estrangeiros viessem suprir a carência de
profissionais em áreas rejeitadas pelos médicos brasileiros.
Médicos cubanos chegaram a ser vaiados e
insultados por colegas em sua chegada ao aeroporto de Fortaleza, em uma atitude
que surpreendeu os dirigentes da Organização Pan-Americana de Saúde, parceira
do governo federal no programa. “Nunca
pensei que fosse chegar a este extremo de preconceito e até racismo, que fossem
dizer que as médicas cubanas pareciam empregadas domésticas, que os médicos
negros deveriam voltar para a África ou que eram guerrilheiros disfarçados”,
lamenta o representante da OPAS/OMS no Brasil, Joaquím Molina.
Neste meio tempo, sempre que a mídia
brasileira noticiou o programa foi para contar quantos cubanos fugiram para
Miami ou os erros que porventura cometeram, ainda que nunca tenha se
concretizado nenhuma condenação. Molina se queixa que, cada vez que era
procurado pelos jornais para defender o programa, ganhava um parágrafo na
reportagem, contra dez do presidente do CFM atacando a ideia. “Pessoalmente, acho que a mídia brasileira
privilegia a notícia ruim. Nunca vi uma manchete positiva neste país”,
critica.
Reuni alguns pontos que a imprensa não
destacou para que as pessoas possam conhecer melhor o programa Mais Médicos.
1. O número de médicos na atenção básica à
população na rede pública do País foi ampliado em 36%: tinha cerca de 40 mil
antes do programa e ganhou 14.462 profissionais, entre eles 11.429 cubanos e
1.187 com diplomas de outros países. A lei priorizou os brasileiros, mas apenas
1.846 se inscreveram na primeira convocatória. Este ano, a situação se inverteu
e 95% das 4.146 vagas foram ocupadas por médicos brasileiros.
2. Além de serem reconhecidos como
excelentes médicos de saúde da família, a principal vantagem dos médicos vindos
de Cuba, segundo a OPAS, é que vieram todos de uma vez, em um pacote. Outra
vantagem é que qualquer abandono que não seja por razões de saúde é coberto
pelo governo cubano, que envia outro profissional sem nenhum custo adicional
para o governo brasileiro. A OMS situa o sistema de saúde cubano entre os 39
melhores do mundo; o sistema de saúde brasileiro aparece na 125ª posição. Ao
contrário dos brasileiros e profissionais de outros países, os cubanos também
não escolhem para onde querem ir, é o ministério e a OPAS que decidem para onde
serão designados.
3. Uma avaliação independente feita em
1.837 municípios revelou um aumento de 33% na média mensal de consultas e 32%
de aumento em visitas domiciliares; 89% dos pacientes reportaram uma redução no
tempo de espera para as consultas. Uma pesquisa feita em 2014 pela Universidade
Federal de Minas Gerais, baseada em 4 mil entrevistas em 699 municípios,
revelou que 95% dos usuários estão satisfeitos ou muito satisfeitos com o
desempenho dos médicos. 86% dos entrevistados afirmaram que a qualidade da
atenção melhorou após a chegada dos profissionais do Mais Médicos e 60%
destacaram a presença constante do médico e o cumprimento da carga horária.
Queridos por seus pacientes, vários médicos cubanos têm sido homenageados pelas
câmaras municipais por seu trabalho no Brasil.
4. O programa cobre 3.785 municípios, sendo
que 400 deles nunca haviam tido médicos. Os 34 distritos indígenas contam hoje
com 300 médicos; antes não tinham nenhum. Entre os yanomami, por exemplo, houve
um aumento de 490 atendimentos em 2013 para 7 mil em 2014, com 15 médicos
cubanos dedicados à etnia com exclusividade. 99% dos médicos que atendem os
índios no programa são cubanos.
5. Ao contrário do que os jornais veiculam,
os médicos e médicas cubanos não são proibidos de se casar com brasileiros.
Existe uma cláusula que os obriga a comunicar os casamentos para evitar bigamia
em seu país natal, segundo a OPAS. Os casos de romances entre médicos/as e
brasileiros/as são numerosos. Houve até uma prefeita em Chorrochó, na Bahia,
que se casou com um médico cubano.
6. Desde que o programa Mais Médicos
começou, 9 médicos cubanos morreram: cinco por enfarto, 3 por câncer e 1 por
suicídio (em 2014, um médico de 52 anos, ainda em treinamento, foi encontrado
morto em um hotel de Brasília, possivelmente por enforcamento). Até agora,
somente oito abandonaram o programa e deixaram o país rumo aos EUA.
7. O Programa Mais Médicos virou modelo no
continente e países como a Bolívia, o Paraguai, o Suriname e o Chile, que
também sofrem com falta de profissionais, já planejam fazer projetos
semelhantes.
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