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segunda-feira, 22 de junho de 2009

KAFKA

Ainda na juventude, aí pelos 15/16 anos, li dois livros de Franz Kafka, escritor que sempre exerceu enorme influência sobre a moderna literatura mundial. O primeiro foi A Metamorfose no qual o personagem principal acorda pela manhã e constata que se transformou em uma enorme e cascuda barata. A partir daí, Kafka faz uma análise crítica do drama psicológico que passa a afetar o relacionamento familiar do personagem. Imagine o que faria você, pai, mãe, avós, irmão ou irmã, de alguém que sustentava toda a família e que amanhece transformado em uma repugnante e gigantesca barata.
O outro livro que me envolveu emocionalmente foi O Processo. Neste, Kafka conta a história de um homem que foi preso e acusado por um crime que não cometeu e que nunca lhe é revelado qual foi. Durante o processo em que é julgado e condenado, ele sempre jurou sua inocência. Entretanto, os juízes lhe perguntavam: “Você é inocente de quê?" Talvez, se soubesse responder, ele não teria sido executado.
Quem lê esses dois livros jamais os esquece. Kafka é o surrealismo em seu estado mais puro e emocional. O que parece absurdo está presente em toda a obra de Kafka. A realidade está sempre a um passo da loucura como em nossos sonhos e pesadelos.
É algo tão bizarro como o que vem acontecendo com o pai biológico do menino Sean (9 anos) que luta obstinadamente, e sem sucesso, na justiça brasileira, pela guarda do próprio filho. Um direito, neste caso inalienável, reconhecido até pela Convenção de Haia. O menino virou um joguete nas mãos e mentes de nossos juízes.
Não dá para entender como, em suas variadas instâncias, nossos juízes julguem de forma tão diferente um mesmo caso, permitindo tantos recursos e adiamentos, jamais tomando uma decisão definitiva. O caso do menino Sean é um processo kafkiano.
Depois que a Justiça Federal determinou que ele fosse devolvido, em 48 horas, ao seu pai biológico, um ministro do STF – aquele parente do Collor que consegue ser mais pedante e pretensioso que o Gilmar “Dantas” – concedeu liminar determinando que o menino ficasse no Brasil até julgamento definitivo pelo Supremo. O plenário do STF, então, cancelou a liminar e devolveu o caso à Justiça Federal do Rio de Janeiro. Isto é, como Pilatos, apenas lavou as mãos. Por que o STF, com todo o seu poder de última instância, se negou a dar uma decisão definitiva no caso e acabar com a pendenga?
Acontece que, no mesmo dia, outro juiz federal do Rio concedeu uma nova liminar ao padrasto para que Sean permanecesse no Brasil até o julgamento do mérito do mandado de segurança.
Portanto, de nada valeu a decisão do STF. E continua a agonia kafkiana do pai biológico que disse estar vivendo uma tragédia em suas indas e vindas ao Brasil.
Até quando vai durar a bizarra e vexatória balbúrdia do judiciário que trata com tão pouco caso um drama familiar que já dura cinco anos?
Em compensação, a 8ª. Câmara Criminal do Rio de Janeiro reverteu o tipo de pena do traficante Elias Maluco – que torturou, matou e carbonizou o jornalista Tim Lopes – de regime integralmente fechado para o regime fechado. Neste regime, há o recurso de progressão da pena para o regime semi-aberto e, até, para a liberdade condicional após cumprir um terço da sentença. Em 2007, um cúmplice do mesmo assassinato – o Zeu – foi beneficiado com a progressão do regime, saiu para visitar a família e não mais voltou. O próprio Elias Maluco estava em liberdade condicional quando matou Tim Lopes. E quantos outros assassinos hediondos não têm sido beneficiados pelos nossos juízes?
O que será que ocorre nas entrâncias, instâncias e entranhas do poder judiciário para fazê-lo agir de forma assim tão incompatível com a lógica e a inteligência humanas? E ainda há quem diga que decisão judicial não se discute, cumpre-se.
Viva o Poder Legislativo! Lá, pelo menos, tomamos conhecimento das mazelas secretas e podemos usar o poder do voto a cada quatro anos.

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